Tuesday, May 15, 2007

Mudança

Saturday, February 10, 2007

Para acabar de vez com a consciência.

Hoje é Sábado e é supostamente o dia de reflexão anterior à chamada às urnas que se verificará amanhã, Domingo 11 de Fevereiro de 2007. A pergunta colocada aos portugueses é de certa forma simplória, mas ainda mais, a tonalidade em que se colocou a discussão entre o “sim” e o “não”:

 

“Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”

 

Não pretendo, nem nunca pretendi substituir-me na autoridade que cada indivíduo deve ter sobre as suas opções, avaliações, nem – acima de tudo – moralizar os actos de outrem. A minha resposta é sim, obviamente, porque se trata de uma decisão cuja escolha cabe a quem se depara com a questão, e os parâmetros individuais cabem senão ao próprio indivíduo avaliar.

O Feto. O nascimento. O bebé. O ser humano.

Cientificamente, estão comprovados alguns factos interessantes que aqui são relevantes.

O ser humano nasce mais prematuramente do que os mamíferos mais próximos de nós. Segundo o Professor Doutor Carlos Amaral Dias, “tudo aquilo que se passa durante o 1º ano de vida da espécie humana é apenas aquilo a que eles [os biólogos contemporâneos] chamam uma fetalização extra-uterina, ou seja, os processos de fetalização continuam fora do útero, enquanto que nas outras espécies, que nos são similares, são adquiridos 'in-utero'”.

Esta prematuridade é uma estratégia da evolução conjugada com o aumento do perímetro craniano humano: ou as “mães” desenvolviam um pélvis enorme para comporta-lo no nascimento ou adoptavam a estratégia que se verificou: a prematuridade. O que é facilmente verificável: o tempo de dependência dos progenitores por parte de uma cria humana, ultrapassa em larga escala o equivalente nas outras espécies mais próximas.

Pode-se sintetizar esta questão – algo grosseiramente - da seguinte forma: Para as mães não terem que desenvolver um pélvis gigantesco para a cabeça do bebé passar, ele passou a nascer mais prematuro que nas outras espécies (com o processo evolutivo do crescimento craniano).

Ainda não saindo das lucidez do saber do Professor Carlos Amaral Dias, “Não há momento nenhum no mundo humano que seja tão violento, tão disruptivo como o nascimento. Porque é a passagem de uma meio hiper-protegido, que é o útero (...), para um lugar exterior a esse meio que é radicalmente diferente”. Evoco aqui, com as palavras do Professor, o trauma da respiração, o valor adjacente ao “poder respirar”, o valor intrínseco que tem tem a respiração ao longo da história humana, na arte, na literatura.. O nascimento provoca “de repente” que se tenha que respirar, ver e sentir de variadas formas, o que antes não acontecia naquele ambiente líquido e quente que era o útero da mãe. Este acontecimento, é assim o “gerador metafórico da experiência, da experiência humana”.

Um momento tão marcante como o nascimento, num ser prematuro, tem uma série de consequências encadeadas. Ainda segundo o referido Académico, a criança humana é o mais dependente de todos os seres. “Ao sermos prematuros por tanto tempo, temos a capacidade de manter características da prematuridade ao longo da vida, como a curiosidade. Apesar de muitos mamíferos serem curiosos, nós mantemos essa curiosidade ao longo da vida, enquanto eles param”. Por exemplo, os chimpanzés, os seres actualmente mais próximos de nós, aprendem até aos dois anos de idade.

NOTA: Tive acesso as estas ideias do Professor Doutor Carlos Amaral Dias, no entanto, desconheço a sua posição sobre o aborto, o referendo ao aborto ou qualquer outra questão relacionada. Esta recolha de ideias serve única e exclusivamente como ajuda à minha elaboração da definição de Vida Humana e nenhuma das posições aqui expressas poderá ser imputada ao Académico em questão.

A inteligência humana, deve-se, em grande parte a este paradoxo: O de nascermos mais prematuros que os outros mamíferos, que se pode afirmar que provoca um desencadear de reacções que originam a inteligência.

Esta diferenciação tão traumática entre o “antes” e o depois do “nascimento” num ser tão relativamente prematuro traz-nos finalmente à definição da vida humana. Poderia dizer, de certa forma, que o que define um ser humano como tal e no que será de futuro é o momento em que começa a respirar. O nascimento. Este é um factor crucial para nos diferenciar das outras espécies, pois o ser humano é-o enquanto tal, com as relações que estabelece começando com a dependência pós-nascimento. Esta é uma definição crucial de Vida Humana, pois uma criança que nasça sem depender dos seus, imagine-se sem outros humanos por perto, poderá ser muitas coisas, mas Humana no sentido lato do termo não será: falta-lhe a relação.

A Vida Humana distingue-se da vida animal com a Relação e não com o aglomerado de células em determinado ponto da sua existência.

A ciência fornece-me aqui dados e noções para eu poder avaliar e responder amanhã: Sim.

Esta confusão entre a definição de Vida Humana e vida animal é perversa, e leva a trocar a noção de vida de tal forma que não admira que exista hoje uma tendência essencialmente urbana de HUMANIZAR OS ANIMAIS, e da consequente mas silenciosa BESTIALIZAÇÃO DO HOMEM.

Vivi estas últimas semanas intoxicado com esta “coisinha” do “coraçãozinho” que já bate com poucas “semaninhas” do “fetinho” (saberá esta gente que as lagostas e as ameijoas são boas quando cozidas ainda vivas?).

Intoxicado e enjoado com a coisa das avaliações das condições de vida que teria um bebé ou não, com os “é preferível” aqui ou acolá.

Enojado com a coisa do “tem-se que melhorar o procedimento adopção”, quando como no caso de Torres Novas, hoje parece que o que basta para “adoptar” é uma nota escrita pela mãe e pronto.

Enraivecido pela comunicação constante de que “se votar sim, você é mau, mauzinho, mauzão, não p'esta!”.

Amedrontado com esta gente que o que quer é bebés, bebezinhos por todo o lado, muitos bebés...

Sobretudo muito preocupado com a crescente mercantilização das coisas do coração, nunca o “mau” e o “bom” foi tão perversamente aplicado sem Saber, sem conhecimento, sem Ciência, e tão sequer..... sem fé. Não vi uma única intervenção de fé que dissesse: “acredito em Deus e no sagrado do momento da concepção”, tão pouco...

Aterrorizado pelos argumentos da gente do não. Serão os mesmos que um dia quererão banir Darwin, ou o neo-Darwinismo e a Evolução das Espécies das escolas como já o fazem alguns americanos mais retrógados.

Este post surge hoje, dia de reflexão, numa tónica de desrespeito puro em resposta ao desrespeito pela consciência que se tem verificado.

E surge hoje, aqui, para lhe dar um repto:

 

Vote não, se deseja ser uma “boa pessoa”.

Vote não se o Saber, a Ciência e toda a evolução do conhecimento humano não lhe dizem nada.

Vote não, se deseja Acabar de Vez Com A Consciência.


Tuesday, January 09, 2007

God Save the Kings

Passaram-se dias sobre Dia de Reis, o tal alusivo à visita dos Reis Magos. Curiosamente é quando são oferecidos os presentes ao Recém-Nascido, mas o Pai-Natal, toda a publicidade e a movimentação da “bewildered heard” na caça ao presente ignora o facto.

Terminada a quadra, respira-se de alívio.
Começa finalmente a haver lugar para estacionar, para caminhar e deixa-se de chocar contra famílias inteiras hipnotizadas pelas montras no seu balbuciar murmurante e sentimento comunitário do “estamos nas compras”, aquele sentimento simples na qual se sente a manada vomitada dos shoppings, que descobre as montras no frio iluminado das ruas da cidade que tanto ignoram durante o ano.
Finalmente deixa-se de esperar numa fila de bomba de gasolina, para pagar o tanque cada vez mais caro, que o pai e as duas filhas discutam qual a melhor caixa de “Barbies” sob o sorriso cúmplice e discreto da empregada para com todos os presentes que desesperam. Numa estação de serviço.
Também, os penduricalhos brilhantes e adocicadamente “lolly-pops” começam a sair de tudo quanto é canto vazio, a limpeza possível dos ambientes regressa e a ausência dos enfeites volta a deixar sobressair as faces vazias e encerradas sobre si mesmas no vazio de história e de futuro que estas gentes deste país de império quedado mostram na sua normalidade.
Até que enfim que desaparece o contraste entre quem recebe 14 meses e quem não recebe, entre quem tem que juntar dinheiro para a quadra e entre quem não tem como. Começa-se a dissipar esta solidariedade mentirosa dos que de repente se lembram dos “pobrezinhos” e oferecem um kilo de arroz ou um litro de leite à saída do super-mercado, dos natais dos hospitais onde os idosos se quedam esquecidos e desterrados pelos seus – que se lixem os cuidados paliativos, desde que continuem os natais dos hospitais, pois, finalmente cala-se a mentira da solidariedade na voz de um povo mesquinho que não se preocupa nem com o futuro da sua identidade nem com as graves assimetrias que a ilusão dos Écu's ocultou sob o manto das infraestruturas.
Assim, termina mais uma época para esquecer, sobre a qual ninguém mais quer falar. Pois como se não bastassem as toneladas de doces consumidos pelas famílias, a memória que dela resta nada mais é do que um presente ou outro especial, ou dos kilos ganhos na celulite que se pretendem derreter preparando a Primavera-Verão que aí virá, sim, isso, do Natal ficam os kilos a perder, a memória de uma identidade civilizacional transforma-se num monte de banha nojenta a perder, a deitar fora, a expulsar. Indago-me sobre todos os kilos ganhos por todas as pessoas nesta quadra e neste país, acumulados, possivelmente encheriam de banha e celulite toda a bacia do Alqueva, numa barragem viscosa, mal-cheirosa e repleta de bolhas putrefactas com o excesso de solidariedade mentirosa ingerida neste Natal.
Os silêncios que finalmente chegam e também soam muito bem. Depois dos coros, dos jingles dos shoppings e dos sininhos que pairam por todo o lado, reinstala-se o silêncio do vazio das faces sobre si encerradas destas gentes anónimas que deambulavam pelas ruas. A mentira pessoal está novamente confinada à esfera individual.

Neste silêncio, neste vazio, nesta ressaca de desperdício, encontro finalmente espaço para me lembrar com saudade do Madeiro que era acendido, em miúdo, no adro da Igreja. Dos cantares “filhozes com vinho/não há igual”, dos sons dos crepitares das lareiras, das famílias reunidas, da paz que se instalava, das tréguas que se declaravam e dos cheiros de lenha no ar frio e seco que nos faz sentir com mais capacidade de respirar. Dos cumprimentares aos “updates” sobre as vidas e o último ano decorrido, às famílias ligadas mas um pouco distantes que nesta altura se tocavam. Tenho saudades de todo um clima que se instalava, e culminava com comunicações no Dia de Reis, quando ainda se desejava um bom Dia de Reis.

Pois na nossa identidade é neste dia.
Hoje, do que resta dela, este dia é reduzido ao desmanchar da árvore de Natal, e início da expulsão da gordura viciosamente acumulada..

Wednesday, November 29, 2006

"Laurinda Uber Alles"

I am Señora Laurinda Alves
My aura smiles
And never frowns
Soon I will be priestess...

SCIENCE Power will soon go away
I will be Cardinal one day
I will command all of you
Your kids will MEDITATE in school
YOUR KIDS WILL MEDITATE IN SCHOOL!

[Chorus:]
Laurinda Uber Alles
Laurinda Uber Alles
Uber Alles Laurinda
Uber Alles Laurinda

ZEN FASCISTS WILL CONTROL YOU
100% NATURAL
You will jog for the MASTER RACE
And ALWAYS WEAR THE HAPPY FACE

Close your eyes, can't happen here
Big Bro' on white horse is near
The HIPPIES won't come back you say
Mellow out or you will pay
Mellow out or you will pay!

[Chorus]

Now it is 2024
Knock-knock at your front door
It's the suede/denim secret police
They have come for your UNCOOL NIECE

Come quietly to the camp
You'd look nice as a drawstring lamp
Don't you worry, it's only a shower
For your clothes here's a pretty flower.

DIE ON ORGANIC POISON GAS
Serpent's egg's already hatched
You will croak, you little clown
When you mess with BEATA LAURINDA
When you mess with SANTA LAURINDA

[Chorus]

Do original "California Uber Alles", Dead Kennedys - 1979
Obrigado, Jello Biafra.

Primórdios

F.
AS então oferecidas pequenas folhas secas em livros, autocolantes especiais ou pensamentos mágicos de descoberta da nostalgia do então presente ou da fantasia do que poderia vir mas nem tanto, são rasgos que permanecem como a tentativa de descobrir do outro, do sentir o outro, de querer conhecer o que é estar no outro. F. foi uma menina cujo standard alertou-me para o que havia além algures, além dos meus comboios miniatura, além do meu gosto pela brincadeira dos pontos e das notas, além da mera sobrevivência dos intervalos como pontos de encontro desinteressantes e desiguais no contacto com meninos cujo pai tinha o carro x e a mãe o carro y, mas cujo mundo máximo era uma ida aos caramelos de Badajoz, ou às raízes familiares da Madeira. F. tornou-se mais tarde numa adolescente típica nas LC's pertencentes aos outros, dando assim os seus primeiros passos em direcção à sua prostituição privada.

T.
OS pequenos passos dos intervalos, os corares envergonhados causados por algum saber já  incipiente, os pequenos encontros de apreciação, os olhares cruzados que se evitavam, os pequenos desenhos que se viam com orgulho e o fervor da recordação daquele rosto pálido mas sobejamente sereno provocavam um descanso sobre o próprio gosto da acção. T. progrediu como seria esperado, no seu standard estabelecido. De facto, tão diferente, tão standard - a parvinha! - sucumbiu ao dito e ao que se dizia, veiculado pela amiguinha namorada do tóxico assaltante de vivendas, que findou na venda de si mesma na Estrada do Guincho. T., hoje, deverá ser alguém sofisticado,no entanto, isto aqui descrito nunca existiu.

B.
UM aniversário por convite de arrasto conduziu a uma primeira coisa-tipo-namorada: tardinhas fins-de-aulas, truques de encontro e telefonemas marados à parte foi uma existência inexistente, como creio que terá sido a vida que se seguiu à traiçãozinha da "curtição", à separação e retorno, em suma à nulidade dela própria sobejamente experimentada.

L.
UM conhecimento casual, um aniversário especial, uma intensidade serena que se diluia no tempo de contacto transformou algo inesperado em algo inesperado. A partir de interesse diverso, L. tornou-se na primeira oferta de rosa no dia dos namorados, dos encontros de cinema ao fim de semana à tarde no defunto Miramar, nos passeios, na especialidade de um convite a casa quando sozinho, na segurança e tranquilidade transmitidas, de forma duradoura. Uma existência sempre presente sobejamente estragada por mim, com ingenuidade caída em tramas de invejas alheias, má gestão e trapalhice dos inícios de explosão adolescente. Um reencontro é sempre uma recordação tão presente como a ausência de sentido do presente, apesar da mulher que foi e é.

F. foi uma menina, cuja história é similar à de tantas outras: tanto no tempo em que decorreu a evocação aqui presente, como na posterioridade. Da mulher de hoje pouco ou nada sei, nem - sinceramente, me interessa, pois o desconhecimento faz-nos o favor de se encerrar a si próprio.
F. Foi a minha primeira paixão, como um sub-woofer colocado sobre o órgão ainda mínimo e impreparado onde jazem este tipo de sentimentos.

T. foi uma menina, cuja história é diversa à de tantas outras: tanto no tempo em que decorreu a evocação aqui ausente, como na posterioridade. Da mulher de hoje, pouco ou nada sei, nem - cinicamente, me interessa, pois o desconhecimento faz-nos o favor de se abrir em si próprio.
T. foi a minha segunda paixão, um vislumbre do que poderia ser, e do que pode cair por tão pouco com gente que é tão pobre. Mesmo na diferença.

B. não foi uma menina, cuja ausência de história é igual à de nenhuma: tanto no tempo em que  decorreu a expiação aqui presente, como anterioridade. Da menina de hoje, pouco ou nada sei, nem - admiravelmente, me desinteressa, pois a sensação faz-nos o favor de se anular em si própria.
B. Foi o meu primeiro protótipo de namorada. Protótipo porque um nada em nada se torna, e se algo se pretende que se torne, só depende de quem vê: e é incompleto, uma experiência.

L. foi uma mulher, cujo fado é similar ao de tantas outras: tanto no tempo em que decorreu a evocação sempre presente, como na posteridade. Da mulher de hoje, tanto ou nada sei, pois o conhecimento faz-nos o favor de se renovar em si próprio.
L. foi de facto a minha primeira namorada, depois da qual, ainda hoje procuro recuperar o bem-estar sereno que é simultâneo com a víscera sofisticada do significado. O sentido que hoje não faz, existe na evocação da transformação aqui evocada e molda-me o paradigma mordaz que me faz ser e estar na paixão.

A veleidade daquilo que nos é de especial intensidade dilui-se com o tempo, com o crescimento, com os lugares por onde passamos, pelos seres onde nos transformamos.

Que tenebrosos segredos terá o leitor que após estas palavras se interrogue em como poderei eu ter escrito estas linhas...
Seja bem-vindo, ou vá-se lixar - como prefira - pois são meus e estão aqui estes Primórdios.

Três Títulos

"PJ detém antigo segurança ligado ao caso Camarate"

"Em Alfragide: Recém-nascido encontrado com vida dentro de um saco térmico"

"Desconhecem-se as razões: Tribunal suspende processo de José Veiga relativo ao banco Dexia"

Numa rápida radiografia às últimas notícias, num determinado momento, deparam-se-me estas três notícias. O insólito não se encontra em cada uma nem no conjunto, mas simultaneamente em cada uma e no conjunto.

Tinha eu pouco mais de 5 anos, e na TV de um vizinho observo uma multidão pesarosa em directo no primeiro programa da RTP, era o funeral de Sá Carneiro. Foi a primeira vez que observei a dedicação da massa anónima a um desconhecido conhecido e, confesso, que me aferiu posteriormente o que sinto relativamente ao fim de uma vida. Trágico, ou "natural" se tal for possível, um fim de vida é um extinguir, é a dispersão última da matéria que compõe - ou compôs - a vida de uma pessoa tal como os seus conterrâneos a conheceram.

Um início de vida é também algo assinalável, e por razões diversas, a minha experiência também valoriza o recato, alguma serenidade e espaço para a azáfama que provoca o aparecimento de uma nova vida entre os seus. Esta do saco térmico é para mim nova, e o termo último dos super-mercados & shoppings, já que é comum um tipo cá chegar e zás, ninguém o deixa em paz e enchem-lhe o berço e arredores de Chicco's, Fisher-Price's e Toys afins.
Porra, há um mundo inteiro de visões, faces, cheiros, tactos, sensações, pessoas, sabores, afectos, etc. a descobrir e já metem estas merdas todas à frente de um recém-chegado? De facto, só faltava efectivamente uma pessoa nascer e ser metida dentro de um saco térmico.... Shopping por shopping, Fisher-Price por Fisher-Price, venha o diabo (ou porque não deus!?) e escolha....

Nunca gostei lá muito das gentes do futebol, começando nuns, acabando noutros. Não se trata da questão dos milhões que circulam e alimentam muitas bocas, mas sim do tipo de situações que provocam som neste sector: O senhor de clube tal que vocifera acusações sobre fulano de clube tantos, os consequentes ecos e reacções nos media e todo o diz-que-disse envolvido reduz esta gentalha a um papel químico e simétrico das revistas cor-de-rosa, sendo os dirigentes protagonistas, como que as tias das revistas.

A pouca importância que tem cada coisa, no meio de tanta coisa, leva-nos à banalização. Com um pouco de jeito e copy/paste poderíamos recompor as coisas:

"PJ detém Recém-nascido"

"Em Alfragide: José Veiga encontrado com vida dentro de um saco térmico relativo ao banco Dexia "

"Desconhecem-se as razões: Tribunal suspende processo de antigo segurança ligado ao caso Camarate"

... e a banalização é tal que se fossem estes os títulos encontrados, em nada admirariam alguém, pois nunca passariam de meros Três Títulos.

Monday, November 20, 2006

Do Androids Dream of Electric Sheep?

A história de contar carneirinhos para chamar o sono nunca me convenceu. Desde criança.
Recordo-me, desde sempre, que enquanto o sono não chegava utilizava a fantasia... Fosse a de estar num pequeno barco à vela num atol ou num recife, a de possuir a maior maqueta de comboios à escala H0 do mundo, a de ser maquinista de um qualquer TGV que atravessasse toda a placa euro-asiática, a de ser um cientista que descobrisse como dar cabo de bactérias sem dar cabo de células, tantas...!
Quando me entretinha com um qualquer Tio Patinhas e surgia um qualquer simbolismo de sono, além do serrote do ressonar, frequentemente surgiam os carneirinhos a saltar uma cerca. Recordo-me de me ter forçado a experimentar contá-los uma vez em que o sono custava a chegar, fosse por excitação fosse por ansiedade. Lembro-me de ainda ter ficado mais irritado, ora não bastava ter ido para a cama forçado, como ainda por cima aquela actividade estéril e sem qualquer objectivo de contar carneiros a saltar uma vedação, era a mãe de todas as secas.

Este "formato" dos carneiros não é de todo compatível comigo. Sempre me interroguei de onde viriam aqueles carneiros, e para onde se dirigiam após cada salto, e mais: quem ou o que os submeteria à provação da obrigatoriedade de saltar aquela vedação!? Não sei se mais alguém se interrogou desta forma acerca daqueles carneiros. Não sei tão pouco qual o significado simbólico, ou a interpretação que se pode efectuar desta "metáfora" colectiva.

Mas sei que Philip K. Dick conseguiu tocar em algo muito interessante ao colocar a questão de se os Andróides sonhariam com carneiros eléctricos. Para quem não sabe ou não se recorda, é o título do conto que originou o filme "Blade Runner", realizado por Ridley Scott.

Filmes à parte, o título encerra em si todo um conjunto de questões muito interessantes.

Seres diferentes de nós, sonharão?
Se sonham, como se caracterizarão esses sonhos?
Se nós já somos tão diferentes uns dos outros, qual a validade desses "formatos" de sonho?

Afinal, está-se ou não numa sociedade de sonhos fabricados, imaginários-standard e de objectos de afecto modeláveis?

Afinal.. Do Androids Dream of Electric Sheep?

Saturday, November 11, 2006

Viagem de Costas

O mundo passa e os seus fragmentos desaparecem ao fundo da minha vista sob a crescente velocidade em que me vejo a distanciar do ponto objectivo da minha deslocação.

Trago e ficam para trás, rebites de identidade.
Memórias dispersas de recordações, discussões acesas sob o fôlego de vinhos bons, flashbacks, pensamentos paralelos de um "presente-repensado" e escapes irracionais de pura liberdade transversalizam a minha experiência e reúnem-me.
Um espectáculo bizarro-conceptual-mas-contido de sabores lirico-andróginos seguido de uma pequena jam-session bem "swingada" condimentam esta sensação: A de que a viagem de ida foi de costas para o objectivo e a de regresso de costas para a origem.
Quantos não buscarão uma viagem, por mais pequena que seja, para poderem viajar dentro de si próprios?

Fui de costas para lá, onde a amizade ampara.
Regresso de costas para ti onde o teu paradigma me sustém e me revolve no meu próprio paradigma.

Efectivamente, só nos apresentamos de costas a quem confiamos.
Obrigado, por esta viagem de costas.

Thursday, November 09, 2006

Pare, escute e olhe...

.. quer em movimento sensível, quer em movimento relativo.

Ao andar de comboio, vejo-me e revejo-me em diversos tempos, diferentes no ser, diferentes na forma como os olho.

Reparo na pequena passagem de nível que foi "modernizada", na ponte nova, nos novos troços de sensação mais "lisa", nesta carruagem "Corail/UIC" francesa dos anos 60/70 que entraram em serviço pela CP em 1986 após após os choques das colisões de Santa Iria e de Paço D'Arcos, anunciada então como "modernas", e exploradas pelo serviço "alfa" e posteriormente pelos inter-cidades.
Não sou nenhuma autoridade em matéria de transportes ferroviários, mas conservo comigo ainda o meu primeiro conjunto de comboios à escala H0, datado de 1981. Conservo ainda comigo grande parte do que lhe fui acrescentando ao longo dos tempos, e fundamentalmente, conservo muitos dos catálogos que coleccionava - miragens de sonho para uma criança e mais tarde adolescente, cujas liberdades financeiras e de "aquisição de quereres" eram limitadas. Nestes catálogos, bem como nas recordações dos comboios franceses dos meus 5, 6, 7, 8, 9, 10 anos, as carruagens "Corail" encontram-se bem enraizadas: Lançadas em serviço nos anos 60 em França - construídas pela Alsthom, revolucionaram o conceito e velocidade da ferrovia convencional, velocidade máxima então: 220 km/h.

Neste inter-cidades em direcção ao Norte, exacto, não é alfa-pendulino, as velocidades nos troços "modernizados" alcançam valores redondamente próximos destes dos anos 60 da França pré-TGV: 180km/h. Opto por não pagar o excedente fraudulento de luxo cobrado no pendulino português, pois cada unidade custou ao erário público perto dos então 11 (onze) milhões de contos. Este viaja à mesma velocidade que o presente: excepto durante uns míseros 15 minutos de troço entre Porto em Lisboa durante os quais- e muito bem - o pendulino alcança os 200 e tal KM/H. Mais números? Muito bem:

1994, Lisboa St.ª Apolónia - Coimbra-B:
Inter-regional, duração de viagem: perto das 2:20 horas;
Intercidades, duração de viagem: 2:10 horas;
Alfa: 2:05 horas;

2006, Lisboa St.ª Apolónia - Coimbra -B:
Inter-regional, duração de viagem: ???
Intercidades, duração de viagem: 2.15 horas;
Alfa (agora pendular): 1:52 horas;

Se o leitor tem dificuldade em interpretar estes dados, paciência, o problema é seu: Cultive-se, regresse à escola, repense-se, ignore, ou faça o que quiser já que é o inquestionável rei do seu vastíssimo e interessantíssimo mundo. Mas deixe-me em paz e aos que de facto compreendem umas simples linhas, com uns dados muito simples de comparação prática e efectiva no mundo real.

O que é de facto importante é uma pergunta que me persegue de há uns tempos para cá: "Do Androids Dream of Electric Sheep?". Como quem se pergunta: sonharão os andróides com carneirinhos eléctricos?

Outra pergunta que me persegue, não menos sinistra... que caminhos terá a ciência e a técnica sob interpretações abusivas como uma que recentemente vi efectuada pelo editorial da revista Xis do Público?

As pressões para a formatação do conhecimento, do saber, da visão e da sensação... sucedem-se a um ritmo assustador, pois a soma dos múltiplos vazios que por aí não escassam com as perspectivas evangelizadoras sustentadas por uma ciência-de-conviniência começam a tomar proporções assustadoras.

Fico-me por este ligeiro balancear desta zona de travessas de betão e aço, de carris soldados mas não calibrados, que me recordam o charme nauseabundo das carruagens Sorefame do tempo da guerra colonial.... tento dormir, mas não posso.

Paisagens há muito conhecidas sucedem-se pela janela, Coimbra está à porta, sensação de múltiplas sensações ambivalentes... mas distante e saudosamente agradáveis tocam-me com a nostalgia do orgulho de ver a Alta e a Universidade.. lá sobranceira e vetusta sobre o rio, um dos dois únicos na génese de ninfas Portuguesas além das Tágides: as Mondeguinas..

Do Androids Dream of Electric Sheep?

Veremos..