Tuesday, November 23, 2004

E os agressores?

Esta história da violência contra mulheres, tresanda.
Tresanda porque é mais uma discussão feita sem método nem abordagem à profundidade do problema, repleta de interessados/as em fazer carreira na pseudo-filantropia, e recorrente à "chapa 5" da opressão do acto, ao invés de o procurar prevenir e solucionar.

A violência tem sempre dois intervenientes, cada um dos quais, nunca se pode abordar isoladamente um do outro nesta dinâmica relacional.

Temos a vítima e o agressor envolvidos numa relação, seja qual for.
Naturalmente que a pré-vítima não é inerte e neutra no processo que se desenrola até à agressão.
Naturalmente que o pré-agressor deveria poder conter os seus impulsos.

Como se pode verificar nesta dinâmica, uma violência activa existe sempre acompanhada de uma correspondente passiva. É um "equilíbrio" entre os dois intervenientes no processo, com variados âmbitos presentes que ajudam a construir a circunstância.

ambito

Sem pretensão de fabricar uma verdade universal, parece razoável intervir no processo onde ele se desenrola quebrando o ciclo de agressão/aceitação que o eterniza e o protege das consequências e responsabilidades.
Mais uma Aparência.


discussao actual


A presente discussão à volta da violência sobre as mulheres incide sobre a inibição através da censura social do momento do processo em que se passa da Génese dos Impulsos Agressivos à Concretização.


discussao necessaria


A discussão inexistente ganharia outra dimensão se incidisse sobre a inibição do passo anterior: aquele em que se começa a formar a Génese do Impulso de Agressão.

Por isto mesmo, os meios que são empregados na protecção da vítima seriam muito mais eficazes se o fossem na ajuda ao agressor.

São apenas ideias com um pouco de ciência do oitavo ano, não é preciso muito.

É que o agressor também precisa de ajuda. É se calhar o que mais precisa.
Onde estão as linhas gratuitas para o agressor pedir ajuda?
Onde estão os centros de prevenção da agressão a que o agressor deveria recorrer?
Onde estão os anúncios de, por exemplo, uma mulher aos berros e o homem a levantar a mão, de repente aperceber-se do que vai fazer e ao invés de concretizar poder telefonar para uma linha amiga que lhe estenda a mão?
Quando param estas imagens angustiantes das mulheres maltratadas, cheias de hematomas, banais no meio das carnificinas de toda a violência gratuita da televisão, e se transmite uma imagem de esperança?
Quando se aplicará só um pouquinho de ciência - não é preciso muita - e se parará com estes fadinhos pseudo-filantrópicos?
Quando se parará com as sucessivas campanhas negativas e se optará por campanhas positivas, ou estas estão reservadas exclusivamente ao consumo?
E os agressores, não são pessoas como todos nós?
Pê.

5 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Antes de falar de agressores e agredidos, não posso deixar de comentar...Engraçado (ou triste) como assuntos como esse sempre vem à tona nesses famosos diasinternacionaisdaviolenciacontrasasmulheres ou seja lá do que forem e depois morrem assim como vieram... O peso da culpa não poderia funcionar como propulsor de maiores estudos sobre os temas?
E que tal irmos um pouco além (ou retrocedermos?) e pensarmos em nos dedicar seriamente a um estudo dos aspectos multifatoriais que levam a essa violência homem-mulher, ou mulher-homem e não aceitarmos somente atos assistencialistas pós-fato-consumado? Num mundo de especialistas, as discussões se restringem a explorar, “adequadamente”, os aspectos sociais ou biológicos (nunca uma combinação desses fatores e outros mais) sempre em interpretações reducionistas. Em termos didáticos, o modelo exclusivamente sociológico afirma que "a ocasião faz o agressor", enquanto o modelo exclusivamente biológico afirma que "o agressor já está pronto, esperando apenas a oportunidade para agredir". Mas será que para um terceiro modelo, ou seja, um modelo bio-psico-social não haveria métodos de estudo que viabilizassem pesquisas multidisciplinares? Um modelo em que o estudo sobre “a ocasião pode fazer florescer um agressor e fazê-lo agredir” pudesse unir todos os aspectos envolvidos em uma única pesquisa?
Meus parcos estudos de biologia (que também se restringem à escola elementar) não me permitem aprofundar comentários sobre a relevância das diferenças hormonais na agressividade masculina e feminina. Diferenças comumente relacionadas ao comportamento agressivo estão na quantidade do hormônio testosterona, presente em grandes quantidades no homem e em pequenas na mulher, assim como na relevante reviravolta hormonal pré-menstrual na mulher com a queda nos níveis de serotonina, que resultam em irritabilidade e agressividade. Aliás, desarranjos na produção e metabolismo da serotonina, são sempre relevantes nos estudos da agressividade, comportamentos impulsivos e violentos tanto nos homens como nas mulheres.
Mas falando agora de agressores e agredidos, sem distinguir e nem mencionar o sexo (porque já são sabidas e conhecidas as formas de expressão da agressividade no homem e na mulher - os homens geralmente em formas verbais e físicas e as mulheres mais comumente em linguagens não-verbais, em função geralmente de sua dependência econômica, sentimentos de culpa provenientes da educação judaico-cristã, etc...), numa sociedade patriarcal onde se propala uma utópica paridade homem-mulher, a tríade bio-psico-social ainda precisa de muito estudo, rumo em primeiro lugar à superação da educação sexista que já vem sendo denunciada desde o final dos anos 60. Nos anos 70, podíamos vislumbrar novos ares com a tradução do livro da italiana Elena Gianni Bellotti, Educar para a submissão (na falta de um sumário on-line do trabalho de Bellotti, fica o link: http://www.sinprogo.org.br/institucional/cartilhas/cartilha01/artigo01.htm), que veio contribuir no preenchimento de algumas lacunas acadêmicas para uma educação mais igualitária no convívio entre os sexos, interessantíssimo estudo, mas 30 anos se passaram e claro, tudo ficou abafado pelos interesses na manutenção da atual estrutura da sociedade patriarcal.
Buscar a superação das desigualdades homem-mulher, partindo da educação, ao invés de lamentar a atual situação, seria um grande passo para o rompimento dessas relações permeadas pela agressividade e por ofensas constantes, em busca de mais dignidade nos relacionamentos. E ainda devo dizer que é mesmo terrível enxergar o paternalismo e o estereótipo feminino que, geralmente, enfatizam a mulher como vítima assim como as atitudes extremas masculinas que evidenciam seu lado guerreiro mais primitivo e machista.

16:27  
Anonymous Anonymous said...

Antes de falar de agressores e agredidos, não posso deixar de comentar...Engraçado (ou triste) como assuntos como esse sempre vem à tona nesses famosos diasinternacionaisdaviolenciacontrasasmulheres ou seja lá do que forem e depois morrem assim como vieram... O peso da culpa não poderia funcionar como propulsor de maiores estudos sobre os temas?
E que tal irmos um pouco além (ou retrocedermos?) e pensarmos em nos dedicar seriamente a um estudo dos aspectos multifatoriais que levam a essa violência homem-mulher, ou mulher-homem e não aceitarmos somente atos assistencialistas pós-fato-consumado? Num mundo de especialistas, as discussões se restringem a explorar, “adequadamente”, os aspectos sociais ou biológicos (nunca uma combinação desses fatores e outros mais) sempre em interpretações reducionistas. Em termos didáticos, o modelo exclusivamente sociológico afirma que "a ocasião faz o agressor", enquanto o modelo exclusivamente biológico afirma que "o agressor já está pronto, esperando apenas a oportunidade para agredir". Mas será que para um terceiro modelo, ou seja, um modelo bio-psico-social não haveria métodos de estudo que viabilizassem pesquisas multidisciplinares? Um modelo em que o estudo sobre “a ocasião pode fazer florescer um agressor e fazê-lo agredir” pudesse unir todos os aspectos envolvidos em uma única pesquisa?
Meus parcos estudos de biologia (que também se restringem à escola elementar) não me permitem aprofundar comentários sobre a relevância das diferenças hormonais na agressividade masculina e feminina. Diferenças comumente relacionadas ao comportamento agressivo estão na quantidade do hormônio testosterona, presente em grandes quantidades no homem e em pequenas na mulher, assim como na relevante reviravolta hormonal pré-menstrual na mulher com a queda nos níveis de serotonina, que resultam em irritabilidade e agressividade. Aliás, desarranjos na produção e metabolismo da serotonina, são sempre relevantes nos estudos da agressividade, comportamentos impulsivos e violentos tanto nos homens como nas mulheres.
Mas falando agora de agressores e agredidos, sem distinguir e nem mencionar o sexo (porque já são sabidas e conhecidas as formas de expressão da agressividade no homem e na mulher - os homens geralmente em formas verbais e físicas e as mulheres mais comumente em linguagens não-verbais, em função geralmente de sua dependência econômica, sentimentos de culpa provenientes da educação judaico-cristã, etc...), numa sociedade patriarcal onde se propala uma utópica paridade homem-mulher, a tríade bio-psico-social ainda precisa de muito estudo, rumo em primeiro lugar à superação da educação sexista que já vem sendo denunciada desde o final dos anos 60. Nos anos 70, podíamos vislumbrar novos ares com a tradução do livro da italiana Elena Gianni Bellotti, Educar para a submissão (na falta de um sumário on-line do trabalho de Bellotti, fica o link: http://www.sinprogo.org.br/institucional/cartilhas/cartilha01/artigo01.htm), que veio contribuir no preenchimento de algumas lacunas acadêmicas para uma educação mais igualitária no convívio entre os sexos, interessantíssimo estudo, mas 30 anos se passaram e claro, tudo ficou abafado pelos interesses na manutenção da atual estrutura da sociedade patriarcal.
Buscar a superação das desigualdades homem-mulher, partindo da educação (para essa sim, campanha!), ao invés de lamentar a atual situação, seria um grande passo para o rompimento dessas relações permeadas pela agressividade e por ofensas constantes, em busca de mais dignidade nos relacionamentos. E ainda devo dizer que é mesmo terrível enxergar o paternalismo e o estereótipo feminino que, geralmente, enfatizam a mulher como vítima assim como as atitudes extremas masculinas que evidenciam seu lado guerreiro mais primitivo e machista.

19:30  
Blogger joao.filipe said...

Anonymous,

Antes de mais gostaria de agradecer um comentário tão rico que recontextualizou o tema, alargando-lhe o âmbito, que justificará quando oportuno um regresso.
Continuo o agradecimento por me recordar, pois é, que sou homem, de modo que admito francamente que tenho sempre aquele inconsciente que me insere inadvertidamente na cultura da qual sou oriundo.
De facto, no primeiro esquema deveria ter colocado "Indivíduo Z" e "Indivíduo W", assim teria englobado a ambivalência qualitativa dos processos.
As suas referências, Anonymous, sem dúvida que me enriquecerão num outra abordagem a este assunto.
Mas não posso de lhe deixar de dar, como homem, uma palavra quanto aos "dias internacionais":
Fez-me pensar em quantos dias precisaria por ano para dedicar aos tipos de violência que cada um de nós foi alvo, presenciou ou por que terá sido afectado/a. Infelizmente, pelo meu lado, tenho que me recordar todos os dias de várias vivências, fazendo de cada dia "O Meu Dia Internacional de Mim" sem apoios institucionais. E creio que todos poderão dize-lo de uma forma ou de outra, sobre si próprios. Quem disser o oposto, mente-se a si e aos outros.
O facto é que por mais que gostasse, não consigo conceber uma visão total & abrangente do universo de cada vez que abordo um tema, ou faço um post. Concebo mas tenho a limitação de apenas conseguir "ver o universo todo a partir de um único dos infinitos buracos de fechadura" quando calha, e nestas raras ocasiões com 99% de probabilidade de ter uma margem de erro de 99%. Assim, para abordar o que fosse ficaria no interminável "loop" de eliminação de probabilidades, na interminável perseguição de todas as possíveis relações e dificilmente faria um post antes da minha morte que espero que ainda esteja distante.
Estereótipos à parte, nestas coisas de homem/mulher, Anonymous recordou-me de outras reflexões que aqui regressarão, quando me der para isso.
Até porque Anonymous, ao identificar estereótipos, utiliza outros estereótipos.
Será que a atitude masculina primitiva é mesmo a guerreira?
Será que o machismo, paternalismo, patriarquismo e afins serão assim tão arcaicos, ainda mais do que o matriarquismo?
Não será que o problema se centra na falta de assunção de diferenças, ao invés de pretensas igualdades ou combates a desigualdades?
Na minha modesta opinião, creio que só se poderão definir as igualdades depois de definidas as diferenças, o que creio que - quer de um lado, quer de outro - se encontra muito distante.
Mas isto, Anonymous, será tema regressado aqui com um pouco mais de profundidade. Fica desde já convidada para participar!
Assim agradeço-lhe o comentário, e desculpe-me não ter a artilharia de referências desejáveis para legitimar as minhas Diásporas.
Obrigado!

13:55  
Anonymous Anonymous said...

João Filipe,
Gostaria de dizer em primeiro lugar que ao depositar algumas idéias aqui em seu blog, (que devo salientar, foge ao lugar comum), por mais que queira ser imparcial e colocar-me numa posição de observadora ou critica, carrego também uma carga cultural arraigada que impede, por mais que tente, de colocar-me neste papel; e depois, que a abrangência desse assunto é tão ampla que passaríamos a vida mesmo a discorrer sobre ele e, além disso, que é muito bom poder enriquecer-me também com suas abordagens.
Mas voltei (e note bem, sem referir-me à artilharia...risos) para fazer ainda algumas colocações referentes aos seus comentários quanto aos estereótipos usados por mim.
O homem guerreiro realmente não é tão primitivo assim. Fiz referencia a ele pensando no modelo da sociedade patriarcal em que vivemos, sem por isso considerar arcaicos um ou outro modelo. Foram caminhos que nossa sociedade tomou em função da necessidade de sobrevivência da espécie (não que não acredite que um novo modelo mais igualitário possa surgir desde que a eclosão do movimento feminista nos anos 60 colocou sob uma nova ótica, e funcionou como um ativador de novas maneiras de pensar, a condição masculina e feminina na sociedade, buscando construir novos valores sociais, nova moral e nova cultura).
Sabe-se que na era Paleozóica a cultura da caça e coleta de alimentos era a forma original de sobrevivência da espécie humana. O homem era originalmente nômade, quando o inicio da agricultura promoveu a principal mudança nos paradigmas sociais e alterou as regras para a convivência entre homens e mulheres. Na cultura nômade, a base das relações homem/mulher colocava o homem como o caçador, a mulher como a coletora de frutas, raízes e vegetais, já que pela necessidade de manter a prole sob seus olhos a mulher não os abandonava para caçar (é importante salientar a formação nesse período da nossa hoje conhecida sociedade homem/mulher, que garantia a sobrevivência de ambos). A descoberta da agricultura, além disso, trouxe também uma revolução cultural: os caçadores tiveram seu prestígio diminuído. A atividade de caça tornou-se menos importante que a domesticação dos animais outrora caçados. Para os caçadores, as crianças atrapalhavam a caçada, já para os agricultores, elas significam mais mão de obra e por isso muitas culturas tornaram-se matriarcais depois dessa revolução agrícola. Sabe-se ainda que depois dessa nova situação de organização, algumas sociedades tiveram dificuldades de sobrevivência devido às condições climáticas e houve uma corrida para a procura de terras mais férteis, criando situações de confronto e as primeiras guerras. Houve então novamente uma mudança nos papéis sociais do homem, a imagem do caçador-coletador foi deixada de lado em função, só então, da do herói-guerreiro. Por isso minha relação da sociedade patriarcal com o guerreiro.
Caberia ainda colocar aqui algumas palavras sobre essa estrutura patriarcal e sua importância para a manutenção de nossa sociedade capitalista; o homem servindo aos capitalistas como produtor de capital e a mulher encarregada de proporcionar a manutenção de uma infra-estrutura domestica favorável para que ele se dedique inteiramente a sua função de alimentador do sistema, mas deixo para outra oportunidade, já que meu post se estenderia indefinidamente. Além disso, tentar desvendar as diferenças homem/mulher seria um assunto muito interessante de ser abordado também...Bom, assim a coisa vai longe...risos.

16:37  
Anonymous Anonymous said...

Errata: Ooops, post colocado sem revisão dá nisso...Onde se lê: "já que pela necessidade de manter a prole sob seus olhos a mulher não os abandonava para caçar" leia-se: "já que pela necessidade de manter a prole sob seus olhos a mulher não a abandonava para caçar".

21:55  

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